segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

O preço do troco



Uma das funções principais do dinheiro é facilitar trocas e permitir que a divisão do trabalho se aprofunde, levando a ganhos de produtividade via especialização. Por exemplo, em uma economia de escambo (trocas diretas de mercadoria por mercadoria), um padeiro que quer comprar sapatos precisa encontrar um sapateiro interessado em adquirir pães (a chamada dupla coincidência de desejos). Mas em uma economia monetária, o padeiro vende seu produto e recebe moeda em troca, a qual pode ser usada para comprar o que ele precisa. Ou seja, ele não necessariamente tem que achar algum cara disposto a receber pães por sapatos.

Na ausência de moeda, essa dificuldade de encontrar pessoas com demandas e ofertas específicas pode emperrar a divisão do trabalho entre indivíduos. Isso porque algumas pessoas podem achar menos custoso produzir determinado item de que precisam (mas no qual não possuem vantagem comparativa) a encontrá-lo no mercado. A moeda destrava esse mecanismo, incentivando a especialização e levando a ganhos de produtividade.

Outra vantagem da moeda está em sua divisibilidade. Suponha que, nessa economia, o preço relativo de equilíbrio é 100/3 = 33,3333... pães por par de sapatos. Na ausência de moeda, se o padeiro precisa de um par de sapatos, além de achar um sapateiro disposto a receber a receber tal quantidade de pães, ele tem que lidar com os valores não inteiros. A moeda, por ser bem mais divisível que a maior parte das mercadorias, resolve esse problema.

Para que essa propriedade funcione bem, é preciso que os estabelecimentos comerciais estejam dispostos a dar troco se os fregueses não possuírem o valor exato da compra em dinheiro. Caso contrário, as pessoas teriam que carregar quantidades grandes de dinheiro em denominações menores.

É impressionante como esse negócio não funciona muito bem no Brasil. Frequentemente comerciantes pedem que fregueses facilitem o troco, ou recorrem a aproximações nos centavos, ou ainda dão mercadoria (como balas) como troco. Nos cinco anos que morei nos Estados Unidos não presenciei nada do tipo. Talvez por conta de nosso histórico de hiperinflação e/ou da taxa de juros nominal elevada, os estabelecimentos comerciais seguram pouca moeda, o que leva a tais gambiarras.

Claro, com a difusão dos cartões de crédito e débito, esse problema fica cada vez menos importante. De qualquer forma, ainda há locais em que o comércio se dá quase que exclusivamente com dinheiro, como nas feiras livres.

Ontem aprendi um fato interessante com um feirante: a divisibilidade tem preço. Ele me disse que há uma pessoa que presta esse serviço na feira, e que para cada R$100, retorna R$96 em notas de denominação mais baixa e moedas. Achei meio salgado. Mas é provavelmente mais barato do que ir ao banco e tentar trocar dinheiro. De qualquer forma, isso indica que tal propriedade da moeda é de fato valiosa.

3 comentários: