Há uma enorme curiosidade dos alunos de economia, e mesmo de boa parte do público em geral, sobre características dos chamados mercados financeiros. No intuito de saciar ao menos um pequeno pedaço dessa curiosidade, o blog publicará textos sobre o assunto feitos pela "Liga de Mercado Financeiro" da FEA-USP (link para a página aqui). A Liga é uma associação criada e dirigida por estudantes do curso de economia que, no intuito de divulgar a área, promove seminários com profissionais do setor, divulga material de ensino, organiza cursos e produz uma revista com assuntos da área distribuída em várias universidades paulistas.
O texto abaixo, de autoria de André de Souza Lima, introduz de forma didática esses veículos de investimentos conhecidos por sua agressividade -- os hedge funds.
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Em uma tradução livre, hedge funds são fundos que fazem hedge, ou seja, se posicionam comprados e vendidos em diversos tipos de ativos. Eles, dessa maneira, conseguem diminuir sua exposição ao risco de mercado e tentam alcançar retornos mais altos. Na prática, o termo hedge fund é utilizado para diversos tipos de fundos, muito diferentes entre si, voltados a investidores qualificados, com uma estrutura peculiar, pouco regulados e com gestores que, na maioria das vezes, investem seu próprio capital.
O primeiro gestor de hedge funds foi Alfred W. Jones, no fim da década de 40. Ao contrário do que se possa pensar, Alfred não frequentou nenhuma escola de negócios, não tinha um PhD em finanças quantitativas e nem trabalhou em um banco de investimentos. O precursor dessa indústria era muito mais um intelectual do que um investidor, um homem que viajou o mundo de navio e trabalhou em um grupo anti nazista clandestino, o Leninst Organization.
Aos quarenta e oito anos, com apenas cem mil dólares, Alfred criou o primeiro hedge fund da história. Com isso, desenvolveu a estrutura que perdura até hoje: i) taxas de administração, ii) taxas de performance, iii) pouca regulação e transparência de informações para os cotistas, iv) a estratégia long and short, v) alavancagem.
Alfred percebeu, durante seus estudos de análise técnica, que era muito difícil conseguir prever para qual direção o mercado se moveria. Com isso, começou a pensar em maneiras nas quais poderia manter todo o seu capital investido, e ainda assim ter uma menor exposição a todas as reviravoltas que o mercado poderia ter. Sua principal conclusão foi que um gestor de fundos poderia combinar duas técnicas muito poderosas: comprar ações que ele considerava promissoras com dinheiro emprestado (alavancado) e vender outras não tão boas à descoberto. As duas técnicas eram consideradas muito arriscadas, mas, se combinadas, poderiam produzir um portfólio bastante eficiente. Dessa maneira, ele pôde criar o primeiro “Hedged Fund”.
Com o crescimento da partnership, Alfred convidou alguns gestores para cuidar de partes do seu portfólio. Na busca por talentos, ele criou uma estrutura inovadora: a taxa de performance de 20%. O fundo contratava gestores especialistas em diferentes tipos de ações, pedindo que eles investissem seu próprio capital no empreendimento, e dando-lhes 20% do que excedesse algum benchmark. Na realidade, Jones estava criando um fund of funds dentro da sua empresa. Durante os anos 60, o fundo teve retornos espetaculares e foi o pilar para o desenvolvimento de uma indústria que, nos dias de hoje, supera $1,5 trilhão de dólares.
Ao longo dos anos, outras estratégias foram sendo desenvolvidas e a indústria de hedge funds alcançou números robustos, passando de apenas $90 bilhões de dólares no inicio dos anos 90, para $1,5 trilhão de dólares e mais de 8.000 fundos. Mesmo sendo menor que a indústria de mutual funds, os hedge funds mostraram-se, com o passar dos anos, uma alternativa de investimento muito viável e crescente no mercado financeiro.
Com o tempo, cada fundo acabou se tornando especialista em determinada estratégia. De acordo com a Revista Bloomberg Markets (Jan/2006), as principais estratégias são:
1. Event – Driven Strategies: Nessa estratégia, o fundo tenta tirar proveito de determinadas situações, tanto políticas quanto de negócios, que podem afetar o valor de determinados ativos.
2. Long Short Equity: É a técnica que consiste em construir posições compradoras ou vendedoras sobre algumas ações que podem se valorizar ou se depreciar. Essa técnica consegue se beneficiar de grandes distorções do mercado.
3. Macro Investing: Talvez a estratégia mais famosa nos últimos 30 anos, empregada por George Soros, Stanley Druckenmiller e Louis Bacon. É, também, a estratégia mais ampla da indústria. Os gestores trabalham para buscar ineficiências de preços e tentar prever os efeitos nos preços dos ativos de alguns eventos macroeconômicos e políticos.
4. Fixed – Income Arbitrage: Consiste na tomada de posições long and short em ativos de renda fixa. Normalmente os ganhos de arbitragem são aumentados com alavancagem.
5. Convertible Arbitrage: É a estratégia que o gestor combina posições longas em obrigações conversíveis em ações e short nas mesmas ações. Essa estratégia é interessante, uma vez que o instrumento híbrido, ou seja, a obrigação tende a cair de forma menos intensa do que a ação.
6. Commodities: Estratégia em que os gestores tentam prever os efeitos de possíveis ajustes na oferta e na demanda de determinadas commodities. Com isso, torna-se possível, com base em projeções, beneficiar-se de altas ou baixas nos preços.
Com a estabilização da moeda brasileira, a posterior queda na taxa de juros, e o desenvolvimento de gestores independentes em plataformas de private banking ou family offices, ampliou-se no Brasil a indústria de fundos multimercados. De maneira geral, pode-se classificar um fundo multimercado como sendo um hedge fund brasileiro.
Uma diferença importante entre os multi-mercados e os hedge funds é o seu benchmark. Se nos EUA a busca principal é por retornos absolutos, no Brasil essa busca é por superar o CDI.
No Brasil, os fundos multimercados são geridos, em sua maioria, por gestores independentes, ou seja, empresas que não necessariamente fazem parte de alguma instituição financeira, mais conhecidos como Assets. Esse tipo de modelo permite a criação de uma maior gama de opções de investimentos. Essa é a chance de o cliente possuir um atendimento mais personalizado, além do fato de normalmente serem formadas por profissionais com ampla experiência no mercado.
Historicamente, os fundos multimercados brasileiros não precisavam de muito esforço para conseguirem retornos altos. Em virtude da alta taxa de juros, o Brazil Kit – nome dado pela revista The Institutional Investor ao portfólio composto na maior parte de renda fixa, com retornos de dois dígitos, e algumas ações, câmbio, etc – era uma fonte bastante segura de se obter retornos reais de 6%. Com a estabilização econômica e desenvolvimento do mercado de capitais, a indústria de fundos no Brasil vem se sofisticando consideravelmente.
De maneira geral, os fundos brasileiros são bem vistos pelos investidores internacionais. Em Junho de 2011, a Bloomberg elogiou a transparência da indústria de fundos nacional bem como seu retorno, apesar de bastante apoiado em títulos de renda fixa. Algumas das maiores gestoras do país já nem aceitam investimentos, em virtude do seu grande tamanho, comparado ao relativamente pouco desenvolvido mercado de capitais brasileiro.
André de Souza Lima é Gerente de Projetos da Liga de Mercado Financeiro da FEA-USP.
Interesse zero neste tipo de assunto por aqui.
ResponderExcluirMuito interessante este tipo de assunto , abraço ao chorão acima
ResponderExcluirDe fato, nada a ver com a proposta do blog. Mandou mal....
ResponderExcluirAchei interessante
ResponderExcluirAchei interessante!
ResponderExcluirMuito boa a iniciativa, Economista X! Quanto maior a informatividade, melhor. Aos desinteressados com respeito ao tema, somente deixem de ler... não é tão difícil assim.
ResponderExcluirTambém gostei bastante do artigo. Continuem com essa iniciativa pessoal!
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