Na nota, o ex-reitor se defende das acusações e basicamente diz que a culpa é de todo mundo. Ele tem um bom ponto: as decisões de torrar o dinheiro -- que pingou mais generosamente do que o normal na conta da USP no período de vacas gordas -- em novas contratações de funcionários/professores, expansão de cursos, abertura de escritórios internacionais e construção de prédios foram decisões colegiadas. Logo, todo mundo que participou e votou nesses "colégios" são responsáveis pela situação atual. Makes sense.
A nota pode ser lida na íntegra aqui. Destaco o trecho abaixo:
O material jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei. Para compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,nota-do-ex-reitor-joao-grandino-rodas-imp-,1554462Ao terminar meu mandato, da citada reserva, cerca de 1 bilhão e meio estava comprometida com pagamentos futuros; enquanto 1 bilhão restava livre. Tudo isso foi feito com a autorização dos órgãos colegiados indicados pelo Estatuto ou Regimento da USP. Tanto que não houve nenhuma observação, nem dos pró-reitores, nem dos diretores de unidade, durante quase 4 anos. Com a diminuição do recolhimento do ICMS foi necessário lançar mão das reservas orçamentárias, como em outras administrações havia sido feito. Qual o problema? Esse dinheiro existe para quê? Para dar lucro aos bancos? Por outro lado, o nível de endividamento das demais universidades estaduais paulistas é semelhante à da USP.
Abaixo o capital financeiro
O trecho acima é revelador -- e confesso que meio desconcertante. Desconcertante porque temos aqui um ex-reitor de uma das principais universidades latino-americanas maldizendo os bancos por lucrarem com o serviço (de wealth & asset management) que poderiam ter prestado à universidade. Coisa que se espera da juventude do PSTU (será que ele acha que devemos comer em casa para não dar lucro aos restaurantes?)
Mas o trecho é revelador porque dá um excelente insight do que se passava na cabeça desse pessoal. algo mais ou menos assim: "se tem dinheiro, temos mais é que gastá-lo". Fica mais claro agora porque a USP está na situação deficitária atual.
Regras prudenciais de gasto
É verdade que não há incentivos para os administradores das universidades públicas brasileiras serem parcimoniosos na administração do dinheiro em caixa. Mas espera-se que a crise na USP sirva para demonstrar a necessidade de introduzir-se uma espécie de "lei de responsabilidade fiscal" das universidades: regras que (1) imponham limites nos gastos que criam compromissos irredutíveis de gastos no futuro (contratação de pessoal sendo o principal deles) e (2) subjuguem novas decisões de gastos desse tipo à aprovação de um conselho auditor externo à universidade.
Não precisa de muita "tecnologia" para desenhar um esquema de gasto que proteja a universidade de flutuações em sua arrecadação. Um exemplo de um conjunto de regras é o seguinte:
Não precisa de muita "tecnologia" para desenhar um esquema de gasto que proteja a universidade de flutuações em sua arrecadação. Um exemplo de um conjunto de regras é o seguinte:
- Gasto deve ser programado: a universidade deve fazer uma estimativa da tendência de sua receita (ou seja, do PIB do estado) e definir, com base nisso, o seu padrão de gasto futuro (a linha azul tracejada do gráfico abaixo).
- Folha salarial deve ter teto: a universidade deve fixar um teto para o percentual de sua receita que pode ser gasto com folha de pagamento (ativo e inativa) (ilustrado pela linha cinza tracejada no gráfico abaixo). Algo dentro do intervalo 50-60% parece razoável (Harvard, por exemplo, gastou 48% de suas receitas com folha de pagamento em 2013).
- Universidade deve ter poupança: Em períodos de vacas gordas, a universidade deve acumular a receita que excede o gasto programado (área amarela no gráfico abaixo). Essas reservas servirão para cobrir o déficit no período de "vacas magras" (área laranja no gráfico abaixo) entre receita corrente e o gasto programado. Essa poupança deve ser administrada por fundos especializados em "asset managment", à serviço da universidade, e não por professores.
Além disso tudo, a universidade deve perseguir outras fontes de receita que não apenas aquela que recebe dos "contribuintes". Já dei sugestões de como e até fiz umas estimativas do valor que poderia ser arrecadado, respectivamente, aqui e aqui.
Achar que explorar o potencial comercial do seu espaço, dos seus recursos humanos e dos "produtos" que cria -- como já faz as melhores universidades do mundo -- vai comprometer a autonomia da universidade, ou transformar a USP numa empresa de sabão -- como parece ser o receio do pessoal do sindicato --, é uma tremenda besteira.
Note que as despesas de Harvard que estão fora dos 48% gastos com salários e benefícios são na sua maioria itens que na USP são cobertos por outras fontes, ou diretamente pelo Estado (espaço físico), ou pelas agências de fomento (bolsas e equipamento de pesquisa), especialmente a Fapesp. Ou então que simplesmente não existem ou não fazem sentido na contabilidade da USP (depreciação e juros). Mesmo sem analisar o balanço de Harvard, dá para supor que boa parte dos itens serviços e outras despesas inclui gastos que entram nos casos anteriores.
ResponderExcluirEm resumo, os números de comprometimento com folha salarial da USP e gastos com salários e benefícios de Harvard não são diretamente comparáveis. Sua sugestão de que a USP deveria gastar 50 a 60% porque Harvard gasta 50% carece de base lógica ou factual.
Felipe, obrigado pelo comentário.
ExcluirNão sei em que trecho do post eu disse que tem que ser x PORQUE em Harvard é y. Se ficou parecendo que sugeri que temos que estar referenciados em uma universidade em particular (Harvard ou outra qualquer) então por favor delete essa ideia. O número de Harvard foi mencionado com fins ilustrativos.
De qualquer forma, se não concorda com o intervalo que sugeri, escolha outro. O ponto é que isso deve ter um teto T < 100% para que o orçamento possa acomodar outros gastos que a universidade gostaria de fazer (com pesquisa e infraestrutura). Faz sentido?
Não disse mas sugeriu. Blog não é uma discussão matemática. Poupe os formalismos.
ExcluirNão encontrei nenhum argumento no seu texto a favor dos 60% fora a comparação com Harvard. O fato é que as porcentagens não são comparáveis.
O fato de que a porcentagem deve ter um limite superior, que com certeza é menor que 100%, não argumenta em favor dos 60%. Levando em conta as últimas 2 décadas, talvez os 85-90% habituais fossem bem sustentáveis.
Estou afirmando que seu argumento é muito fraco.
"Não encontrei nenhum argumento no seu texto a favor dos 60% fora a comparação com Harvard. O fato é que as porcentagens não são comparáveis."
ExcluirReleia o texto Felipe. Vc não encontrou argumento porque eu não ofereci.
O ponto é que tem que ter um teto. Vc concorda. So?
Sugeri algo dentro de 50-60% e citei o % em Harvard. Não argumentei em favor nem de um nem do outro. Talvez eu escreva um dia defendendo um percentual em particular. Não hoje. Nem amanhã.
Que deve haver um teto é tautológico. Poderia até ser superior a 100%, porque a arrecadação cresce a a universidade poderia emprestar em cima das receitas futuras. Não acho que seria boa ideia, mas é um bom argumento para mostrar que a existência de teto é uma obviedade.
ExcluirSim, concordo que você não ofereceu argumento.
Vocês têm uma paciência infinita com um cara que claramente tá precisando de roupa pra lavar. Ele diz que o argumento é fraco. Depois diz que concorda que não teve argumento. tsc,tsc..esse blog costumava ter comentários menos retardados.
Excluirmas a polemica em torno do rodas não foi justamente porque ele aprovou diversos gastos sem passar pelo conselho universitário? claro que a culpa não é apenas dele, e a propria estrutura da universidade deve ter consequencias sobre isso, mas não dá para eximi-lo parcialmente da culpa
ResponderExcluirAté onde eu sei essa tal de lei de responsabilidade fiscal não serve pra nada. Os estados e municípios continuam com alto endividamento.
ResponderExcluirAlto mas, tirando os casos anômalos que não perduram por muito tempo, ninguém gasta mais do que 60% da receita corrente líquida com folha salarial. Já a USP está pra lá dos 100%.
ExcluirDe qualquer forma, para saber se a lei serve ou não vc deve comparar a situação de envidamento atual com o que seria na ausência dessa lei. Vc acha que sem lei seria melhor?
Uma universidade não é um estado, nem um município, nem uma empresa particular, nem uma banquinha de limonada. A comparação das porcentagens não é muito reveladora.
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