Pelo andar da carruagem são grandes as chances de racionamento de água em São Paulo. E as pessoas estão reagindo a isso. Por exemplo, a demanda por caixas d'água disparou (veja aqui e aqui). O interessante é que esse movimento pode comprometer a eficiência do eventual racionamento: as pessoas encherão suas caixas d'água nos momentos em que há água, para compensar os momentos de falta.
Pior: suponha que haja incerteza quanto à necessidade de água durante o dia -- quem tem filho pequeno sabe do que estou falando. Nesse caso, para se precaver contra essas eventualidades durante os horários de racionamento, as famílias optarão por manter em média uma quantidade maior de água em suas caixas. Isso gera mais ineficiência na alocação de água, pois esses recursos poderiam ser utilizados por outra pessoa que precisa deles (o que é ainda mais grave em uma situação de racionamento).
(O raciocínio acima é uma aplicação do conceito de "poupança precaucional", segundo o qual os agentes poupam mais para evitar situações em que precisam muito consumir, i.e., em que a utilidade marginal do consumo é muito alta. Funções utilidade com terceira derivada positiva, ou utilidade marginal convexa, exibem essa propriedade).
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Mas há potenciais benefícios. A perspectiva de racionamento pode chamar a atenção para o problema da escassez do recurso, incentivando os agentes a adotarem métodos que poupem água. Por exemplo, como ressaltado nos links acima, algumas pessoas estão comprando caixas d'água para armazenar água da chuva, que pode substituir a água encanada em determinadas situações.
Além disso, o eventual racionamento pode forçar as pessoas a se adaptarem, levando permanentemente a hábitos de consumo mais econômicos. Tem um paper interessante do Francisco Costa (EPGE) que mostra esse efeito para consumo de energia, na sequência do racionamento de 2001 no Brasil. Ele compara as regiões Sudeste e Centro-Oeste (onde houve racionamento) com a região Sul (onde não houve racionamento). Encontra que a trajetória de consumo de energia caiu permanentemente no Sudeste/Centro-Oeste em relação ao Sul. O gráfico abaixo (retirado do paper) ilustra esse resultado:
Todavia, acredito que esse efeito deva ser bem mais limitado no caso da água. Afinal de contas, como ressaltado no resto do post, água é um recurso que pode ser estocado pelos indivíduos.
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Não vejo como o racionamento pode ser superior a um mecanismo de ajuste via preço -- isto é, aumentando substancialmente o preço da água para forçar as pessoas a usarem menos do recurso, de modo a equalizar demanda e oferta. Além de induzir menor consumo e hábitos mais econômicos (como no racionamento), esse mecanismo gera alguma receita.
Claro, há uma preocupação justa com distribuição de renda, dado que só os mais ricos poderiam se safar da escassez pagando mais caro. Contudo, o racionamento é também regressivo, pois não é todo mundo que tem dinheiro (ou espaço em casa) para uma caixa d'água, por exemplo. E com o mecanismo via preço não tem jeito: a pessoa terá que pagar mais caro pela água, seja para uso imediato, seja para estocagem.
Mas aposto que a maioria das pessoas preferiria o racionamento a uma mudança nos preços. É só olhar a revolta dos indivíduos com a elevação de preços de alimentos quando ocorre algum desastre natural. Deixo essa discussão, entretanto, para outro post.
(O raciocínio acima é uma aplicação do conceito de "poupança precaucional", segundo o qual os agentes poupam mais para evitar situações em que precisam muito consumir, i.e., em que a utilidade marginal do consumo é muito alta. Funções utilidade com terceira derivada positiva, ou utilidade marginal convexa, exibem essa propriedade).
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Mas há potenciais benefícios. A perspectiva de racionamento pode chamar a atenção para o problema da escassez do recurso, incentivando os agentes a adotarem métodos que poupem água. Por exemplo, como ressaltado nos links acima, algumas pessoas estão comprando caixas d'água para armazenar água da chuva, que pode substituir a água encanada em determinadas situações.
Além disso, o eventual racionamento pode forçar as pessoas a se adaptarem, levando permanentemente a hábitos de consumo mais econômicos. Tem um paper interessante do Francisco Costa (EPGE) que mostra esse efeito para consumo de energia, na sequência do racionamento de 2001 no Brasil. Ele compara as regiões Sudeste e Centro-Oeste (onde houve racionamento) com a região Sul (onde não houve racionamento). Encontra que a trajetória de consumo de energia caiu permanentemente no Sudeste/Centro-Oeste em relação ao Sul. O gráfico abaixo (retirado do paper) ilustra esse resultado:
Todavia, acredito que esse efeito deva ser bem mais limitado no caso da água. Afinal de contas, como ressaltado no resto do post, água é um recurso que pode ser estocado pelos indivíduos.
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Não vejo como o racionamento pode ser superior a um mecanismo de ajuste via preço -- isto é, aumentando substancialmente o preço da água para forçar as pessoas a usarem menos do recurso, de modo a equalizar demanda e oferta. Além de induzir menor consumo e hábitos mais econômicos (como no racionamento), esse mecanismo gera alguma receita.
Claro, há uma preocupação justa com distribuição de renda, dado que só os mais ricos poderiam se safar da escassez pagando mais caro. Contudo, o racionamento é também regressivo, pois não é todo mundo que tem dinheiro (ou espaço em casa) para uma caixa d'água, por exemplo. E com o mecanismo via preço não tem jeito: a pessoa terá que pagar mais caro pela água, seja para uso imediato, seja para estocagem.
Mas aposto que a maioria das pessoas preferiria o racionamento a uma mudança nos preços. É só olhar a revolta dos indivíduos com a elevação de preços de alimentos quando ocorre algum desastre natural. Deixo essa discussão, entretanto, para outro post.
Não sei se um aumento temporário de preços teria muito efeito em grandes cidades, como São Paulo. O motivo é que muitos prédios residenciais não tem contador individual por apartamento, rola uma tragédia dos comuns. Se o aumento de preços fosse percebido como permanente talvez vários prédios mudassem o sistema e a perda social dessa tragédia dos comuns seria tão grande que o planejador central (sindico) estaria disposto a pagar o custo fixo e alterar o sistema dos prédios.
ResponderExcluirNão sei quão relevante é esse efeito que citei sobre o consumo total de água, mas acho que é algo a se checar.
Também acredito que o aumento dos preços não teria muito efeito justamente pelo fato da maioria dos prédios não tem o contador individual. Eu mesmo não teria nenhuma motivação para economizar sabendo que isso poderia não afetar no quanto eu pagaria.
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