terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

O teorema de Arrow


Motivado pela discussão "cientistas políticos e economistas" ocorrida há um tempo neste blog, vou escrever um pouco sobre o teorema de Arrow, fundamental em economia e em ciência política. Ele é o principal resultado na teoria da escolha social. Nesse sentido, assemelha-se ao teorema de existência de equilíbrio de Nash, pedra fundamental da teoria dos jogos. Mais especificamente, vou indicar algumas referências sobre formas possíveis de demonstrar o teorema.

O teorema de Arrow estabelece que nenhuma regra de escolha social que leva um conjunto de preferências dos indivíduos que compõem a sociedade a uma preferência social completa e transitiva pode satisfazer quatro postulados de caráter normativo simples, quando existirem três ou mais alternativas a serem escolhidas pela sociedade. O primeiro, domínio irrestrito, diz que a regra se aplica a qualquer conjunto de preferências possível, por mais estranhas ou extremas que essas preferências sejam. O segundo, critério de Pareto, impõe que a regra satisfaça um critério de unanimidade: se todos os membros da sociedade preferem x a y, então a preferência social resultante diz que x é socialmente preferível a y. O terceiro, independência das alternativas irrelevantes, estabelece que para definir a escolha social entre duas alternativas x e y quaisquer, apenas o ordenamento entre x e y dos indivíduos importa (por isso o nome do postulado). Finalmente, a regra deve ser não-ditadorial, ou seja, não deve sempre definir um ditador para a sociedade, quaisquer que sejam as preferências dos indivíduos. O teorema também estabelece que a única regra de escolha social que satisfaz os três primeiros postulados é a ditadorial. Esses postulados são de caráter normativo, mas não é difícil argumentar em defesa deles.

O teorema, formulado por Kenneth Arrow em sua tese de doutorado, foi publicado com o título “A Difficulty in the Concept of Social Welfare”, no Journal of Political Economy em 1950, e transformado no livro “Social Choice and Individual Values” editado pela Cowles Foundation em 1951. Originalmente,  Arrow não impunha o critério de Pareto e sim dois outros postulados: que a regra de escolha social fosse monótona e sobrejetiva (qualquer preferência social pode ser obtida por meio de algum conjunto de preferências individuais). Em 1963, Arrow acrescenta um novo capítulo ao livro, chamado "Notes on the Theory of Social Choice”, onde discute a literatura que se seguiu à publicação da sua tese, reformula o teorema e discute o critério de Pareto, além de outras coisas.

O livro virou referência fundamental em economia. Elegante e conciso, discute a teoria de escolha social e demonstra o teorema, discutindo as suas implicações. A demonstração original usa o conceito de conjuntos decisivos. Outras demonstrações do teorema surgiram ao longo dos anos. Entre elas, a prova de Barberá, “Pivotal Rules: A New proof of Arrow´s Theorem” publicada na Economic Letters em 1980, desenvolve e utiliza o conceito de eleitor pivotal. Geanakoplos, em artigo publicado na revista Economic Theory em 2005, mas que já havia circulado por alguns anos, fornece três formas elegantes e concisas de se provar o teorema (daí o título do artigo, “Three brief proofs of Arrow´s impossiblity Theorem”). Recentemente, Yu publicou uma prova que simplifica o método de eleitor pivotal de Geanakoplos (“A One-Shot Proof of Arrow´s Impossibility Theorem, Economic Theory, 2012).

Reny (“Arrow´s Theorem and the gibbard-Satterthwaite Theorem: a Unified Approach”, Economic Letters, 2001) oferece uma demonstração do Teorema de Arrow lado a lado com uma demonstração do Teorema de Gibbard e Satterthwaite, outro resultado fundamental em economia, que relaciona escolha social com comportamento estratégico e desenho de mecanismos (como essa nota saiu já bem maior do que eu desejava, deixo para discutir esse resultado em uma outra ocasião). Yu (“A One-Shot Proof of Arrow´s Theorem and the Gibbard-Satterthwaite Theorem, Economic Theory Bulletin, 2013) demonstra, de modo simples e unificado, os dois teoremas.

Esses artigos são leitura obrigatória para qualquer pessoa que deseja se especializar em teoria da escolha social. No Brasil, Danilo Santa Cruz Coelho, orientando de Salvador Barberá na Universidade Autônoma de Barcelona e atualmente pesquisador do IPEA, é um importante pesquisador brasileiro nesse campo tão nobre mas árido da economia. 

2 comentários: