segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Por que (e quanto) estudar?


A literatura microeconômica e de desenvolvimento em educação é extensa e de longa tradição. Mas no campo de crescimento embora não faltem modelos de capital humano e estudos sobre impacto de educação sobre crescimento e renda, não são muitos os estudos que tentam entender porque as pessoas investem em capital humano. Olhando um exemplo específico: em 1960 a mediana da escolaridade média dos países da África Subsaariana era de menos de 1,5 anos. Em 2010 ela tinha saltado para mais de cinco anos. No mesmo período a performance de crescimento dos países da região foi entre o muito ruim ou catástrofe, com raras exceções. Países como Gabão e Gana, por exemplo, cuja renda relativa aos Estados Unidos caiu à metade entre 1960 e 2010 aumentaram em sete e seis anos, respectivamente, suas escolaridades médias no período.

Porque investir tanto em educação em um cenário de aparente estagnação? Talvez porque, apesar de tudo, o retorno tenha aumentado e não está sendo refletido corretamente pelos números PIB. Ou porque os custos caíram. Restuccia e Vandenbroucke (2013, U. of Toronto) vão pelo primeiro caminho. Neste modelo, um pequeno aumento de produtividade – na verdade, PTF - na economia seria suficiente para manter as pessoas na escola. Adicionam como explicação o crescimento da expectativa de vida observado na África no período (a mediana vai de 42 para 56 anos): uma maior longevidade aumenta o retorno de um dado investimento em capital humano. Este é um modelo engenhoso e uma explicação plausível: dado que no futuro a economia será mais produtiva e eu viverei um número maior de anos, meu retorno em permanecer mais tempo na escola será maior também. 

Há alguma controvérsia sobre o impacto de longevidade sobre educação e crescimento. Rodrigo Soares (JPopE, 2006), usando dados da PNAD, encontra um impacto positivo enquanto Acemoglu e Johnson (JPE, 2007) usam dados para um grupo de países e não encontram qualquer efeito de expectativa de vida sobre crescimento. De qualquer forma, muitos economistas vêm utilizando esta hipótese em seus modelos que, pelo menos do ponto de vista teórico, faz bastante sentido. Já a relação entre TFP e investimento em capital humano para a África pode estar em contradição com o fato de que, pelo menos a partir dos anos 70, a produtividade em grande parte destes países passa a cair – e as perspectivas futuras pioram muito – mas os números de educação continuam a melhorar.

Uma explicação alternativa seria de que os custos de se educar diminuíram. De uma maneira informal, podemos pensar em alguns fatores importantes nesta direção. Os países se urbanizaram, de forma que distâncias médias para as escolas são agora menores. O número de escolas e de vagas cresceram, em geral em ritmo maior que a população. Em alguns países pelo mundo afora – e.g., Brasil – há agora transporte, material e livros grátis. Ainda usando o Brasil como exemplo, no meio do século passado quase nenhuma cidade pequena tinha escolas de ensino médio e muitas não tinham ginásio, de forma que as crianças e adolescentes tinham que se deslocar muito ou mudar de cidade se quisessem continuar estudando. Hoje grande parte das cidades brasileiras tem escolas de ensino médio. Imagino que, de uma forma ou outra, o resto do mundo venha evoluindo nesta direção. 

O problema é como medir isto, como conseguir bons dados e evidências sólidas que parecem não estar disponíveis a um custo baixo. Uma alternativa seria construir modelos dinâmicos de crescimento e acumulação de capital humano e usá-lo como uma ferramenta para medir estes custos (mais uma vez, theory ahead of measurement...), mais ou menos como os modelos de mensuração de “wedges” e distorções em ciclos reais (e.g., Chari, Kehoe e McGrattan, Econometrica 2007). Talvez o pessoal de microeconometria já tenha resolvido isto e eu esteja desinformado, de qualquer forma é uma questão importante, e em aberto, que os macroeconomistas têm virtualmente ignorado.

4 comentários:

  1. Vocês fazem uma contratação desse porte e não avisam ? Seja bem vindo Pedro Ferreira !

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  2. Isso mesmo!!! Por que o prof. Pedro Ferreira não se apresentou? Welcome aboard!!!!

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  3. Pedro,
    Sem saber detalhes sobre a história da África, eu suspeito que boa parte do aumento na escolaridade pode ser explicada por políticas governamentais. Antes de 1960, os países africanos eram colônias e eram limitados em seu auto-governo e capacidade de centralizar recursos fiscais. Certo ou errado, quando tornaram-se independentes e passaram a controlar um estado (ainda fraco) capaz de tributar e escolher prioridades de gasto, expandir a educação era parte da agenda reformista.

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