segunda-feira, 14 de outubro de 2013

As contribuições de Fama e Hansen

Dizer exatamente o alcance das contribuições de qualquer ganhador de Prêmio Nobel é uma tarefa ingrata, porque impossível, afinal como resumir em poucas linhas o trabalho de uma vida, ainda mais de três vidas como nesta data.

Neste post vou tentar resumir um pouco a contribuição do Fama e do Hansen, já que tenho mais familiaridade com seus trabalhos.

Acho que posso destacar dois pontos das contribuições do Fama. Primeiro, seu entendimento sobre eficiência de mercado. Segundo, sua metodologia para testar modelos de apreçamento de ativos, notadamente o CAPM.

No primeiro caso, no início da década de 70, Fama explicou o conceito de eficiência de mercado. Os preços refletem as informações disponíveis no mercado privadamente ou publicamente. Se o mercado é fortemente eficiente, os preços refletem as informações públicas e privadas. Se o mercado é fracamente eficiente, os preços refletem as informações públicas. A partir daí surgiu uma imensa literatura procurando formas de testar a eficiência de mercado.

A segunda grande contribuição de Fama é sobre as formas de testar os modelos de apreçamento. Uma grande dificuldade encontrada em estimar o Capital Asset Pricing Modelo, CAPM, é estimar o prêmio de mercado. Nesse caso, o Fama sugere um procedimento em coautoria com McBeth. Esse procedimento já foi superado, no caso pelo GMM do Hansen, mas ainda é usado como referencial da literatura. Os artigos sempre estimam o modelo usando procedimento de Fama e McBeth para entender as diferenças de estimativas. Outra contribuição empírica do Fama é a seguinte. O CAPM não explica bem por que ativos com riscos diferentes pagam retornos diferentes. Após uma série de pesquisas empíricas, Fama e seu coautor, French,  encontraram dois fatores de risco que ajudem a explicar os retornos dos ativos. Esse modelo explica razoavelmente bem os retornos dos ativos de mercado e ficou conhecido como modelo 3 fatores. O primeiro fator é excesso de retorno da carteira de mercado, presente no CAPM. Os dois novos fatores ficaram conhecidos como high-minus-low, HML, e small-minus-big, SMB. Partindo daí, uma imensa literatura se desenvolveu testando novos modelos e mesmo expandindo os fatores de risco para incluir momentum e liquidez.

A contribuição de Hansen é, talvez, mais vasta, ou talvez eu saiba mais o que ele fez do que o Fama. Vamos lá.

Eu acho que a grande contribuição do Hansen foi ter reinventado o método de estimação dos momentos, chamando-o de método generalizado dos momentos - GMM. Os modelos tradicionais de estimação como mínimos quadrados ordinários e variantes, máxima verossimilhança e variantes e variáveis instrumentais são todos casos particulares do GMM. Além do insight econométrico em si, valendo tanto para séries temporais como para cross-section e painel, o método permite a conexão direta entre teoria econômica e teste de modelos por meio da equação de Euler. Depois disso, uma infinidade de modelos econômicos passaram a ser testados por meio do GMM, notamente os modelos de apreçamento de ativos.

Além disso, o Hansen tem contribuições na área de apreçamento de ativos em si. Ele ajudou a expandir a fronteira do conhecimento por meio do chamado fator estocástico de desconto. Nesse sentido, teve um insight espetacular quando sugeriu o uso da fronteira Hansen-Jagannathan para testar modelos de apreçamento.

Há duas contribuições mais recentes de Hansen que merecem ser lembradas. Primeiro, ele desenvolveu junto com o Sargent os modelos de preferência por robustez. Ele escreveu uma séries de artigos, explicando que as pessoas não conhecem exatamente sua função utilidade, mas tomam decisões baseado numa família de utilidades minimizando a desutilidade máxima que podem ter. Outra área recente está relacionada a estimação de riscos de longo prazo. Trata-se de um assunto ainda em desenvolvimento.

21 comentários:

  1. Professor, você teria indicações de leitura sobre o tema (papers clássicos e básicos). Pelo que eu vejo, os testes empíricos para dados brasileiros ainda não são tão vastos. Por fim, você (e outros professores de finanças, como o Bruno) pretendem montar algum curso para a graduação tal como o que dão na pós (sobre pricing)? Essa é certamente uma falha na formação da FEA - temos apenas a matéria do Joe e a do Zeca/Marcos Eugênio sobre derivativos e renda-fixa. Abs.

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    1. As indicações dos artigos vão aparecer naturalmente. O anônimo abaixo já colocou a referência do Cochrane, muito mais competente que eu.

      Os alunos estão em boas mão com os atuais professores de finanças na graduação. Mais é demais.

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    2. mais de finanças nunca é demais.
      acho que até o curso de Contabilidade tem mais Finanças do que o de Economia.
      Por exemplo, um curso de Financial Markets (overview) como o do Shiller para Graduação em Yale.

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  2. Professor Losso, chegaste a estudar teoria da medida na graduação? Qual centro é referência em macroeconometria/econometria nos EUA?

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    1. Estudei um pouco no IME.

      Qualquer escola boa nos EUA funciona para Macro ou Econometria. Eu mencionaria Chicago, mas se eu disser isso, vão falar que estou sendo enviesado. Sabe como é...

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  3. Apenas para complementar o post do Professor, o Cochrane também fez algo parecido no blog dele, colocando, inclusive, link para trabalhos pioneiros do trio. Segue: http://johnhcochrane.blogspot.com.br/?m=1

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  4. Concordo com o professor Oreiro:

    "Hoje a comissão do prêmio Nobel de economia, ao premiar simultaneamente, Eugene Fama e Robert Shiller, conseguiu violar o princípio da não-contradição da lógica, qual seja, de que uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo sob o mesmo aspecto. Se os mercados financeiros forem eficientes, Fama merece o prêmio Nobel pois dedicou boa parte de seu esforço de pesquisa a demonstração teórica e empírica da validade da hipótese de mercados eficientes. Mas nesse caso, Robert Shiller, cujo trabalho de pesquisa é mostrar que a hipótese de mercados eficientes não vale e que, portanto, Fama está errado, não poderia ser agraciado com o Nobel. Se a hipótese de mercados eficientes não for válida, então Shiller está certo e Fama errado; logo o prêmio Nobel de Shiller é merecido, mas o de Fama não. Agora, conceder o prêmio Nobel para os dois significa dizer que os trabalhos de ambos são corretos do ponto de vista científico, logo os mercados são e não são eficientes!"

    Abs

    XX

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    1. É impressionante como esses heterodoxos falam m.. e seguem impunes. E esse Oreiro é um dos piores deles.

      O trabalho de Fama é sobre a definição conceitual das condições necessárias e suficientes para o funcionamento "eficiente" dos mercados. Era um benchmark, assim como a concorrência perfeita é um modelo benchmark pra entender a estrutura dos mercados. Seu trabalho aí foi o de fazer a primeira geração de testes sobre se, e em que medida, essas condições de eficiência eram satisfeitas. Isso abriu uma enorme literatura em finanças.

      Fama nunca fez um trabalho provando que os mercados eram eficientes. O trabalho dele anos depois em parceria com Ken French pode inclusive ser visto como rejeição da hipótese. Esse mesmo trabalho foi também seminal, no sentido que abriu toda uma nova literatura sobre previsibilidade de excesso de retorno de açòes. Há além disso outros trabalhos de Fama sobre direito de propriedades e até trabalhos metodológicos sobre estudo de eventos.

      Mas esses idiotas heterodoxos como sempre estão falando do que nunca leram.

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    2. Quem é Oreiro? Aí vai:

      http://bit.ly/16IDqR5

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    3. Continuo sem conhecer.
      Economista ((X'X)^-1)X'y

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    4. Se o Oreiro tivesse se dado ao trabalho de ler pelo menos o press release do Nobel não teria escrito essa besteira:

      "There is no way to predict the price of stocks and bonds over the next few days or weeks. But it is quite possible to foresee the broad course of these prices over longer periods, such as the next three to five years. These findings, which might seem both surprising and contradictory, were made and analyzed by this year’s Laureates, Eugene Fama, Lars Peter Hansen and Robert Shiller.

      Beginning in the 1960s, Eugene Fama and several collaborators demonstrated that stock prices are extremely difficult to predict in the short run, and that new information is very quickly incorporated into prices. These findings not only had a profound impact on subsequent research but also changed market practice. The emergence of so-called index funds in stock markets all over the world is a prominent example.

      If prices are nearly impossible to predict over days or weeks, then shouldn’t they be even harder to predict over several years? The answer is no, as Robert Shiller discovered in the early 1980s. He found that stock prices fluctuate much more than corporate dividends, and that the ratio of prices to dividends tends to fall when it is high, and to increase when it is low. This pattern holds not only for stocks, but also for bonds and other assets."

      http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/economic-sciences/laureates/2013/press.html

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  5. Oreiro para variar nao entende como funciona a ciencia, principalmente a economica...os trabalhos de Shiller provavelmente seriam diferentes nao fossse o conhecimento previo, entre eles o do Fama.

    Economista X linha

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  6. E qual a contribuição de Fama e Hansen para o mundo real? Isto é, há algum trabalho deles que gerou uma aplicação útil para a humanidade? Dê exemplos, por favor.

    Ps: a pergunta não é irônica, é de verdade mesmo. Por exemplo, o trabalho do Roth tem utilidade no mundo real.

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    1. O trabalho deles ajudou outras pessoas ainvestirem melhor seu dinheiro, criando todo uma nova indústria de fundos (baseados em índices e não em gerentes iluminados que cobravam fees enormes).

      É óbvio que isso é nada perto do universalimos da contribuição da penicilina ou da roda pra humanidade. Mas as contribuições da economia são grandes os suficientes pra justificá-la comoa "rainha das ciências sociais".

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    2. Acho que não dá pra atribuir a quase nada na Economia um efeito no mundo real, pelo menos num curto prazo. Pra se ter uma idéia, o CAPM, absolutamente obsoleto em sua forma básica (dos trabalhos de Lintner, Sharpe e Black), ainda é usado por ~74% dos CFOs (Harvey,2001). Com o tempo, as idéias da academia vão se solidificando e sendo absorvidas.
      Mas o processo, em economia, diferentemente de Medicina, por exemplo, tem uma persistência de hábitos muito maior, pois nada é "desprovado" e provado de maneira absolutamente inconteste e incondicional.

      Quanto a questão da indústria de fundos, acho que o trabalho deles ajuda mais a diferenciar um administrador competente, verdadeiramente gerador de alpha, daqueles que fazem um "ride the trend" alavancado e emergem como gênios em época de boom, quando na verdade estão apenas mais expostos a riscos de mercado.

      ps: "Rainha das Ciências Socias" é puxado. Prefiro "Dismal Science" do Carlyle

      Mestrando X

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    3. That's racist!


      Malcom X

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  7. E o Fama ganhou ainda mais fama ($$$$$).

    Ti dum dum, ptzzzzzz!

    Humorista X

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  8. Gostei da avaliação do Mandelbrot, na autobiografia que saiu ano passado: in his memoir "The Fractalist", page 226. It reads:
    This was the same Fama who, in 1964, submitted a thesis subtitled "A Test of Mandelbrot's Stable Paretian Hypothesis." He believed that successive price changes were statistically independent. I had to convince him that I had never claimed independence and that he was in fact testing a much weaker hypothesis-the one that was first expounded in Bachelier's 1900 Ph.D. thesis and had become known as the martingale hypothesis. Fama conceded, corrected his earlier assumptions, replaced the mysterious label "martingale" with "efficient market," and built his career on becoming its champion. This hypothesis is convenient indeed, and it is, on occasion, useful as a first approximation or illustration. But on more careful examination, it failed to be verified-and for being its herald, Fama should receive neither blame nor credit.

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  9. http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1713

    X

    Sua missão, antes de sair do blog, é destruir a idiotice dos Oreiros de direita do Instituto Mises!

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