segunda-feira, 14 de abril de 2014

Política industrial

O Estadão de domingo estava recheado. Além da coluna do Pastore (comentada pelo Cesg), teve também entrevistas com Armínio Fraga e Mauro Borges (ministro do Desenvolvimento). Esta última chamou minha atenção, de maneira negativa (veja aqui).

O ministro faz uma defesa da política industrial do governo, mas com uma justificativa bem estranha. Abaixo trechos em que ele fala sobre o assunto:

Em momentos ruins para a indústria, o governo sempre deu algum tipo de ajuda. Acabou essa mamata?
Acabou de forma nenhuma. Vamos dar o apoio à indústria como todos os países avançados industrialmente. Temos um parque fabril que poucos países têm. O governo vai estar o tempo inteiro do lado da indústria dando todos os apoios. A política industrial é efetiva no Brasil, como é nos Estados Unidos, na Alemanha, na China, no Japão. Os países desenvolvidos sempre fizeram política de desenvolvimento regional. No dia em que o País que veio de um mundo subdesenvolvido se propõe a fazer uma política de conteúdo nacional até a nossa imprensa vem contra a gente. 
O sr. está se referindo aos questionamentos na OMC, como o do Japão?
Do questionamento geral. Os economistas liberais brasileiros são contra a política de conteúdo nacional. Qualquer política industrial no mundo tem uma natureza de defesa da sua indústria. Eu queria desafiar qualquer economista liberal brasileiro para dizer que não tem política industrial nos países desenvolvidos. Tem uma capa ideológica escamoteando a discussão. O governo brasileiro vai continuar fazendo política industrial, sim, em defesa da sua indústria, como todos os países fazem. 
Qual será defesa do Brasil na OMC?
A defesa é que temos o direito de ter política industrial como eles têm. Política industrial é política de desenvolvimento tecnológico. Isso eles têm abertamente. Por que o Brasil não tem o direito de ter sua política de desenvolvimento industrial se os países desenvolvidos praticam essa política há mais de 200 anos? É uma defesa do direito da soberania brasileira de ter uma política de desenvolvimento tecnológico.

Minha leitura é que o argumento é: vamos fazer política industrial porque os outros fazem. Uma possível forma de racionalizar isso é imaginar que a indústria tem economias de escala e, se o tamanho do setor se reduzir muito, haverá perda de produtividade. Como outros países subsidiam suas indústrias, eles podem roubar espaço do Brasil no mercado internacional, impedindo assim que nossa indústria cresça e ganhe produtividade. Por isso seria importante subsidiar nossa indústria também.

Ou seja, trata-se de um equilíbrio de Nash ruim, em que todo mundo gasta recursos para subsidiar seu setor industrial só para evitar que outro país ganhe mercado. Em equilíbrio, o gasto é em grande medida inútil, pois não muda muito a posição relativa dos países. O melhor seria buscar mecanismos de coordenação internacional para evitar tais subsídios.

Mas há algo mais importante nessa discussão: países desenvolvidos possuem outros fatores que elevam sua produtividade, como infra-estrutura, educação, saúde e serviços públicos de melhor qualidade, menos barreiras burocráticas, etc. Se adotamos políticas públicas só porque os outros o fazem, por que não atacar esses aspectos?

17 comentários:

  1. About others protecting their industries, my grandma said: dont hammer your head simply because someone else hammered his

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  2. Gosto dos textos do Mauro. Sempre bem escritos e instigantes ao debate, sem ter que recorrer à arrogância típica de alguns foristas deste blog.

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  3. NÃO ACABOU A MAMATA NÃO....

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  4. A política industrial, com foco nos subsídios e nas barreiras comerciais, teve papel importante no desenvolvimento econômico dos países industrializados?

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  5. Os países industrializados tem uma política protecionista tão intensa? Por que geralmente a Heritage Foundation descreve as políticas comerciais deles como bastante livres....

    Fica a impressão de que o Brasil mija no chão por que a Alemanha derramou uma gota fora da privada.

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    1. Os EUA têm um monte de barreiras tarifárias e não-tarifárias. E usam as compras militares para fazer política industrial. E a Heritage Foundation faz ideologia, não ciência.

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    2. http://www.heritage.org/index/trade-freedom

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    3. A não ser que você indique algum melhor, os índices da heritage são as melhores expressões quantitativas de diversos tipos de políticas.

      E um conselho, sua intuição não é capaz de avaliar diversos tipos de políticas em inumeros países no mundo e fazem uma comparação quantitativa entre elas. Intuição é palpite.

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    4. Somente um imbecil para achar que os EUA tem proteção industrial. Basta ir para qualquer comércio nos EUA e ver como - em total contraste com a situação do ultra-protecionista Bananão - uma proporção gigante dos bens a venda são importados.

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    5. Parece que na Economia tudo se resume a chamar o outro de idiota o tempo todo, seguindo uma hierarquia natural das coisas: o pós-graduando chama o graduando de idiota, o professor da USP chama o professor da UNIP de idiota, o formado em Harvard chama o formado em Cornell de idiota, o professor do MIT chama o professor da USP de idiota... e assim por diante. Credenciais externas ao trabalho científico em si parecem ser muito apreciadas num meio em que ninguém lê ninguém.

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    6. Eu não vejo isso Anônimo14 de abril de 2014 22:57

      "O" Anônimo é usualmente agressivo mas isso é uma particularidade proporcionada pelo fake. No mais, ele está certo....

      O fato de um ou outro setor de algum modo é protegido por alguma política não torna o país exemplo de sucesso de política industrial, só idiotas discordarão.

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    7. O "O" está correto. Mas na foto ele está meio feio...
      Além disso, em setores com forte capacidade de lobby, como alguns na agricultura, a proteção é alta sim.

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    8. Essa proteção alta não é apenas para alguns produtos tradicionais da agricultura americana como milho , trigo, algodão e açucar ?

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  6. Intriga-me que no Brasil as políticas são SEMPRE guiadas por critérios normativos. P., o argumento do cara é "vou fazer pq fazem"... Como a sociedade aceita algo assim? Por que ninguém questiona a efetividade dessas políticas ou alternativas ou qualquer coisa. O cara justifica as coisas e fala como se os "neoliberais" fossem uns poucos "chatos enchendo o meu saco". Porra, não da.. esse país não tem uma única pessoa séria no poder.

    Intriga-me tanto quanto intriga-me os ainda defensores do socialismo, tbm defendido com base em normas estupidamente questionáveis. Jamais apresentam um argumento positivo para nada. Assim até minha avó defende as coisas. Vou sugeri-la que tente um cargo público nas eleições e, quiçá, seja indicada para um ministério!

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  7. O problema é o cara achar que só existe um jeito de fazer proteção a indústria. Existem N jeitos, assim como existem os jeitos certos e os errados. Idem para abrir a economia. O Bacha, no Estadão de alguns domingos atrás, defende uma abertura gradual, ele tem um plano. Porque é óbvio que não se protege pra sempre. Neguinho ignorante adora dizer que Coréia do Sul protegeu a indústria. Protegeu... e depois abriu. Deu mamata? Deu, mas deu pra quem sobreviveu ao primeiro corte e tinha condições de competir. Excelente debate aqui.

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