Em um post anterior, que pode ser encontrado aqui, levantei algumas questões a respeito da ineficácia das políticas contra acidentes de trânsito no Brasil. Minha tese geral é que a política de trânsito no Brasil carece de dados e estudos técnicos que justifiquem as decisões que são tomadas. Comecei a discutir esse assunto neste post aqui.
Minha indignação em particular é sobre a (in)eficácia dos radares eletrônicos para evitar acidentes de trânsito. Obviamente, se a função objetivo da autoridade de trânsito for a arrecadação de multas, os radares parecem ser muito eficazes.
O radar eletrônico funciona assim, em vez de os agentes de trânsito seguirem a lei e pararem o motorista infrator por excesso de velocidade, valem-se da exceção à regra legal, alegam que não conseguem identificar o motorista infrator e, por isso, e acabam penalizando apenas o proprietário do veículo, pois apenas o veículo infrator é identificado pelo radar. De fato, o artigo 257 do Código de Trânsito Brasileiro registra que a multa deve ser imposta ao condutor do veículo e, ao proprietário do veículo, somente se o infrator não for identificado (parágrafo sétimo do mesmo artigo).
Apesar da proliferação dos radares eletrônicos, os efeitos práticos têm sido diminutos. (Por efeitos práticos, entenda o número de mortes por acidentes de trânsito no Brasil, que não cai). Entre as razões, menciono as seguintes:
a. Os motoristas aprendem onde estão os radares e freiam antes;
b. As multas por excesso de velocidade são financeiramente baixas. Isto é, o preço cobrado por infringir as leis de trânsito é baixo;
c. Existe uma certa tolerância para as multas, já que se podem tomar multas desde que não se ultrapassem os 20 pontos na carteira. Isto é, há uma demanda por infração de trânsito limitada ao número de pontos admissíveis na carteira;
d. Os radares eletrônicos têm um baixo desempenho, conseguindo flagrar apenas uma parte dos motoristas infratores;
e. Há várias formas legais de burlar o sistema de multas como:
- Comprar os pontos de alguém;
- Passar a multa para algum conhecido;
- Colocar o veículo em nome de pessoa jurídica (mas o preço aumenta);
- Concentrar as multas em uma única pessoa na família;
- Simplesmente não pagar a multa, já que a probabilidade de ser pego é relativamente baixa (30% dos veículos apreendidos são abandonados nos pátios de São Paulo);
- Fraudar o sistema de multas (veja a notícia que saiu recentemente aqui, divulgada em 18/10/2013);
- etc.
f. Descrença no sistema de punição por falta de ver outras pessoas sendo multadas.
As pessoas não percebem que estão sendo multadas, nem que outros motoristas estão sendo multados. Isso gera uma sensação de impunidade, que acaba por estimular o comportamento delitivo. As autoridades deveriam cumprir a lei e parar o motorista infrator, aplicando-lhe diretamente a multa. Não o fazem, sob a alegação de que isso geraria o caos, sobretudo numa cidade como São Paulo. É verdade, no equilíbrio atual em que muita gente transgride. Todavia, isso não é verdade em países civilizados, como nos EUA.
A pior consequência da política do radar é que ela não impede o motorista mais imprudente de causar um acidente grave. O que os radares provavelmente impedem são acidentes pequenos e de baixos prejuízos materiais. Mas aquele motorista imprudente, que sai "rasgando" nas ruas e estradas, esse não é controlado pelos radares. Ele não está nem aí. Esse sujeito tem que ser parado e servir de exemplo para os demais motoristas, porém ele não é impedido. Para dar um exemplo, assista à reportagem do Fantástico de 08/09/2013 sobre caminhões imprudentes aqui e me explique que acidente o radar impede. Dou um exemplo que foi gravado, mas é óbvio que existem inúmeros outros que não são.
O radar tem alguns efeitos bons. Primeiro, democratiza a emissão de multas. Agora não vale mais a "carteirada". De certa forma, evita, por isso, a propina aos agentes de trânsito aos custos anteriormente mencionados. Mas tem um efeito lateral ruim: serve para que as autoridades de trânsito se acomodem, deixem de vigiar diretamente as ruas e estradas, confiando na capacidade dos radares de reduzir a velocidade dos veículos. Com isso, aumentam a arrecadação dos entes da federação.
Minha questão é a seguinte: quantas vidas um radar adicional salva? Alguém sabe a resposta?
PS: Ouvi hoje no rádio que vão reduzir a velocidade máxima na Av. Paulista de 60 Km/h para 50 Km/h. Alegação: reduzir os acidentes de trânsito. Que acidentes? Não sei. Ninguém fala quanto aumentou. Acho que tem a ver com bicicletas. Escrevi sobre essa política de redução da velocidade máxima neste post.
g) muitos radares não funcionam, pergunte aos taxistas.
ResponderExcluirO uso de radares 'falsos' e' comum no resto do mundo tambem.
ExcluirO custo e' alto, entao para cada radar "de verdade" colocam-se varias outras caixas vazias.
O motorista nao tem como saber qual funciona e qual e' enganacao num primeiro momento. Assim aumenta-se o efeito de "deterrence" com um custo baixo.
Obviamente a estrategia correta e' ficar mudando a localizacao dos radares, tanto dos verdadeiros quanto dos falsos, senao com o tempo as pessoas aprendem quais sao os falsos. Os primeiros a aprender sao os taxistas que sao os que mais rodam pela cidade.
Conclusao: radar que nao funciona = ok. Posicao fixa = not ok
(nao moro no brasil e nao sei se a posicao e' fixa ou nao, estou so dando um exemplo)
Por isso que os radares tem que ser móveis e de difícil visualização ou então fazer o radar por velocidade média em dois pontos da via, além de aumentar substancialmente o preço da infração (valor da multa). Mas apenas o fato de os acidentes não terem reduzido não implica em ineficácia, pode ser que sem os radares os acidentes teriam aumentado. Tem que ver o contra-factual! Bom acho que vcs sabem isso melhor do que eu.
ResponderExcluirO contrafactual, no caso, não seria deixar de fiscalizar, mas fiscalizar diferentemente. Certamente, ausência de radar aumentará o número de acidentes.
ExcluirApesar de achar os radares por velocidade média mais eficazes, se as burlas ao sistema forem predominantes, o efeito será mínimo.
Claro, 9 valor da multa e punições têm que aumenta, sobretudo qdo houver acidente com vítimas, mas não necessariamente ou somente poe excesso de velocidade.
Não tem como pegar um cross-section com municípios ou estados e utilizar os dados de radares por km de rodovia, acidentes de transito por carro, consumo de alcool por pessoa, etc... e fazer uma correlação ?
ResponderExcluirEstou tentando. Será que existem esses dados? Vamos ver. Se existirem, aposto que engenheiro não tem a menor idéia do que é contrafactual.
ExcluirOi Rodrigo, aparentemente o Gov Federal passou a publicar alguns dados de multas e acidentes ( http://dados.gov.br/dataset/multas-rodovias-federais http://dados.gov.br/dataset/acidentes-rodovias-federais). No entanto, pela olhada rápida que dei, não me parece simples relacionar o local da multa com o dos acidentes (além de não ter info clara sobre a data de implementação de radares)... mas de qualquer forma acho que vale a pena olhar um pouco mais a fundo. Talvez algum prefeitura tenha esses dados apresentados de uma forma melhor.. Abs
ExcluirInteressante observar o seu ponto de vista Rodrigo.
ResponderExcluirGostaria de saber a sua opinião sobre as vias onde exitem apenas a placa de fiscalização, mas não existem os radares fixos.
Os motoristas costumam conhecer a localização dos radares fixos e por isso estes acabam tendo apenas a função de uma mera lombada, ou seja, diminuir a velocidade apenas naquele trecho. No entanto, com a presença da placa que informa que há fiscalização naquele trecho, ele pode ficar receoso por não saber se tem ou não um radar móvel ali e que ele possa não ver.
No fim, o benefício dos dois será o mesmo, mas a placa é mais barata. Sei que essa conclusão é um pouco precipitada e pode-se entender a partir dela que então, a solução seria sair instalando placa de fiscalização eletrônica pela cidade inteira. O meu ponto é que pelo menos parece que em uma via na qual haja um radar fixo e em outra uma placa. Há uma maior tendência dos motoristas a andar dentro do limite de velocidade no segundo caso.
Abraço.
Radares escondidos podem ser interessantes. Mas, eu acho q temos q evoluir da punição/multa com fins arrecadatórios p fins pedagógicos e de exemplificação.
ExcluirE vem mais por aí: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/10/prefeitura-de-sp-diz-que-novos-radares-comecam-ser-instalados-em-2014.html
ResponderExcluirSerá que o trânsito vai fluir melhor?
ExcluirRodrigo, aparentemente tem um paper que resume vários estudos sobre acidentes e radares (e o resultado da implementação dos mesmos) ..dá uma olhada aqui: http://gridchicago.com/wp-content/uploads/2012/04/Speed-cameras.pdf
ResponderExcluirRadares não funcionam, mas lombadas talvez funcionem em alguns casos. É uma p* sacanagem colocar lombada em avenida, mas sempre vai funcionar pra frear o pessoal em alguns casos (semáforo/travessia de pedestres).
ResponderExcluirE outra que se um maluco a 140kmh passar de madrugada na avenida, o radar realmente nao vai fazer nada, mas a lombada vai fazer o maluco se matar. Isso é "ótimo" no sentido de incentivos. Talvez não seja "ótimo" se ela criar por si só esse acidente....em outras palavras, o custo dela é alguns danos mais ou menos graves a motoristas desavisados...
OMG what's up with u and radars? I though u were a finance guy!
ResponderExcluirWho pays for my fines?
ExcluirMais uma forma de desvio desse e de outros problemas relacionados ao trânsito:
ResponderExcluirhttp://www1.folha.uol.com.br/tec/2013/10/1360668-descobri-que-waze-era-usado-para-evitar-blitze-ao-chegar-no-brasil-diz-diretora-do-app.shtml
De Losso, consegue fazer um post sobre as pessoas que burlam o transito pelo acostamento e como coibi-los?
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